16º Domingo do Tempo Comum
Acolher, ouvir, servir – Lc 10,38-42 – O caminho de Jesus para Jerusalém é um caminho permeado por cenários que constituem verdadeiras pérolas preciosas. O Evangelho deste 16º domingo do Tempo Comum está inserido nos relatos desta grande viagem de Jesus, desde a Galileia até Jerusalém. Jesus vai com os discípulos, instruindo-os a cada passo. Na “escola de Jesus”, eles vão sendo orientados sobre os valores do Reino e a futura missão de anunciar ao mundo a salvação. Como no Evangelho do 15º domingo, o da “parábola do bom samaritano”, um relato exclusivo de Lucas, temos mais um episódio que só se encontra em Lucas. O cenário do Evangelho é uma casa de família onde vivem duas irmãs: Marta e Maria. Estas duas mulheres, em João, são identificadas como irmãs de Lázaro e moram em Betânia, perto de Jerusalém. Em Lucas, porém, não se menciona Lázaro e elas não estariam morando em Betânia, pois Jesus mal iniciara sua caminhada na Galileia. Afirma apenas que Jesus “entrou em certa povoação e uma mulher chamada Marta recebeu-O em sua casa”. É provável que Lucas tenha recolhido este episódio e o tenha colocado no seu esquema teológico sem se preocupar com a localização geográfica. Isto sinaliza para a importância que Lucas dá a esta catequese. Mais do que uma história de acolhida numa casa, trata-se da teologia do discipulado. A importância da hospitalidade encontra-se em outras páginas da Sagrada Escritura. Olhemos o texto mais de perto. Na casa onde Jesus é recebido há duas mulheres, que são irmãs. Marta parece ser a “dona” da casa. Tem toda a iniciativa e é sempre citada antes de Maria que, provavelmente, é a mais nova. Jesus é recebido na “casa de Marta”. A narração silencia sobre a presença de alguma figura masculina e não faz qualquer referência aos discípulos e nem ao grupo de mulheres que vêm com Jesus desde a Galileia (cf Lc 8,1-3). O foco é Jesus e as duas mulheres. Marta, a dona da casa, “atarefava-se com muito serviço”. Marta destaca-se no “servir” (cf Jo 12,2). Mas também Marta faz a grande confissão de que “Jesus é o Filho do Deus vivo”, confissão esta que os Sinóticos atribuem a Pedro. Maria, por sua vez, está simplesmente sentada aos pés de Jesus, a ouvir a sua palavra. Em João, Marta “serve” e Maria unge Jesus. A posição de Maria, “sentada aos pés de Jesus”, é a posição típica de um discípulo que escuta atentamente as lições do seu mestre. Paulo, mais tarde dirá que aos “pés de Gamaliel” ele foi instruído na Lei (cf At 22,3). O surpreendente do relato é que se trata de uma mulher que, aos pés do mestre, ouve a palavra. No judaísmo era quase impossível um mestre aceitar uma mulher no grupo dos discípulos. Marta se sente sobrecarregada de trabalho e se dirige a Jesus e não a Maria. Marta parece muito familiar e sente Jesus muito de perto. Há intimidade e confiança. Jesus, por sua vez, não a recrimina, como tanto se interpreta. Ao dizer “Marta, Marta”, por duas vezes, mostra que há familiaridade, amor no que ela faz. Mas constata que Marta anda “inquieta e preocupada com muitas coisas”. Para ser discípula, precisa sentar-se aos pés de Jesus e escutar sua Palavra. Jesus é o centro e o serviço é consequência do amor à Palavra. Muitas vezes, este episódio é lido como oposição entre “ação” e “contemplação”, com Marta representando a vida ativa e Maria a vida contemplativa. O que está em causa é a identificação do discípulo, que senta-se aos pés de Jesus para ouvir a Palavra e nutrir a intimidade com Jesus. Todo discípulo missionário, todas as Martas, também hoje correm o risco de andar “inquieto e preocupado com muitas coisas”, pois “a messe é grande e os operários são poucos”. Mas todos precisam “escolher a melhor parte”, ou seja, nutrir-se da Palavra e assim poderem “atarefar-se nos diversos serviços”. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ