2º Domingo da Quaresma

03/03/2023

“A transparência do divino” – Mt 17,1-9 – Neste segundo domingo da Quaresma a Igreja nos presenteia com um dos mais significativos relatos bíblicos: o da “transfiguração de Jesus”. Trata-se de um episódio do NT no qual Jesus é “transfigurado”, ou seja, a figura humana de Jesus é “transpassada” pela figura do divino e Ele, no alto de um monte, se torna “radiante”. O relato está presente nos evangelhos sinóticos (cf. Mt 17,1-9; Mc 9,2-8; Lc 9,28-36) e há uma referência em uma epístola (II Pd 1,16-18). O número de relatos revela em si, a sua importância nas comunidades primitivas. Nestes relatos, Jesus e três de seus apóstolos vão para uma montanha. Lá Jesus começa a brilhar e os profetas Moisés e Elias aparecem ao seu lado, conversando com ele. Jesus é então chamado de “Filho” por uma voz no céu, como já ocorrera no seu batismo.

O contexto literário do relato ajuda a vermos melhor o que está por trás das palavras. Jesus havia feito o seu primeiro anúncio da paixão (cf. Mt 16,21-23) e dado uma instrução sobre as atitudes próprias do discípulo: renunciar a si mesmo, tomar a sua cruz e seguir Jesus no seu caminho de amor e de entrega da vida (cf. Mt 16,24-28). Parece que os discípulos se viram desanimados e frustrados, pois o projeto no qual colocaram suas esperanças resultará num tremendo fracasso. Seus sonhos de glória, de honras, de triunfos vão na contramão do que Jesus propõe.

O episódio da transfiguração visa ser uma palavra de ânimo para os discípulos, pois manifesta a glória de Jesus e revela que Ele é o Filho amado de Deus, mesmo na cruz. O projeto que Jesus apresenta é um projecto que vem de Deus.

A narrativa é construída sobre elementos simbólicos tirados do Antigo Testamento.. O monte é lugar de grandes revelações e alianças. O brilho do rosto e o esplendor das vestes recorda Moisés descendo do Sinais com as tábuas da Lei. A nuvem indica a presença de Deus. Moisés e Elias representam a Lei e os Profetas. O temor e a perturbação dos discípulos são a reação lógica de qualquer pessoa diante da manifestação da grandeza, da onipotência e da majestade de Deus. As tendas lembram o tempo do êxodo, quando o Povo de Deus habitou em “tendas”, no deserto. Como se pode ver, não estamos diante de um relato fotográfico de acontecimentos, mas de uma catequese, construída de acordo com o imaginário judaico, destinada a ensinar que Jesus é o Filho amado de Deus, que revela à humanidade, o projeto divino.

Diante da cruz no horizonte, dos dissabores e tentações, das perseguições e incompreensões, manter-se fiel na opção feita é um imenso desafio. Então Jesus oferece uma experiência mística aos discípulos, de vislumbrar a transparência do divino na pessoa humana de Jesus.

O desejo de Pedro de construir três tendas no cimo do monte, pode significar que os discípulos queriam deter-se nesse momento de revelação gloriosa, ignorando o destino de sofrimento de Jesus. O silêncio de Jesus mostra que o caminho da “transfiguração” tem de passar pelo caminho do dom da vida, da entrega total, do amor até às últimas consequências. Então todos seremos “transparência”do divino, a verdadeira identidade da Vida Religiosa Consagrada e de todo seguidor de Jesus. Ir. Zenilda Luzia Petry  – FSJ