30º Domingo do Tempo Comum

21/10/2021

“Senhor, eu quero ver novamente” (de maneira nova!) – Mc 10,46-52 – O Evangelho deste domingo constitui a última etapa do itinerário que Jesus iniciou com os discípulos na Galileia e que o levará a Jerusalém, ao encontro da paixão, morte e ressurreição. Desde o início do Evangelho de Marcos Jesus vinha ensinando e realizando obras de salvação. Quando o Senhor chamou os primeiros discípulos, eles deixaram tudo imediatamente (cf Mc 1,16-20), não esperaram um segundo convite. À medida que foram seguindo, apareceram as dificuldades. Não compreendiam a proposta de Jesus, viam o messianismo com um olhar desfocado, suas pretensões eram outras. Estavam no “seguimento”, eram “discípulos”, eram generosos (cf Mc 1,16-20), audaciosos, disponíveis, dedicados, mas queriam um Messias sem cruz (Mc 8, 32). Seus olhos não eram capazes de ver um Messias que caminhava para Jerusalém, onde seria crucificado.

O episódio deste domingo situa-nos à saída da cidade de Jericó. Jericó, a “cidade das Palmeiras”, é uma das cidades mais antigas do mundo. Trata-se de um oásis, situado na margem do rio Jordão, a norte do Mar Morto, que dista cerca de 30 quilômetros de Jerusalém. Na época de Jesus, era uma cidade relativamente importante, onde Herodes, o Grande, tinha edificado um luxuoso palácio de Inverno.

Poderíamos iniciar imaginando Jesus se movimentando por Jericó e, junto d’Ele, uma grande multidão. Talvez o ambiente fosse de festa, de euforia. Jesus o grande profeta, homem famoso estava na importante cidade de Jericó. Crianças e idosos, saudáveis e enfermos, cultos e humildes, todos queriam vê-lo. (Zaqueu subiu numa árvore!)

A narrativa está perpassada por um senso de urgência: chegaram a Jericó e logo saíram. Parece que Jesus e os seus têm pressa para seguir o caminho. Mas lá está o cego Bartimeu, “a beira do caminho”, um mendigo, um excluído, que vive fora da cidade, rejeitado, “castigado por Deus”, segundo a doutrina oficial. O cego atrapalha a pressa da comitiva: grita, clama, tira o “brilho” da caminhada. Os discípulos, não a multidão, os discípulos ordenam que se cale, que não incomode.

Enquanto Jesus está com os seus discípulos “a caminho”, o cego está “à beira do caminho” e sozinho. Já havia tanta gente “no caminho”, não havia lugar para quem estava “a beira do caminho”! Mas este cego estava bem informado, sabia quem era Jesus. Ouvindo que Jesus passa, ele grita fortemente! “Filho de Davi, tem piedade de mim”. Jesus ouve e manda chamá-lo. Os discípulos o fazem imediatamente, talvez para se livrar daquele incómodo o mais rápido possível. Ou até para parecerem atentos e generosos: Coragem! Levanta-te, Ele te chama. Fazer figura é algo nada desconhecido entre nós!….

Bartimeu dá um salto, o salto decisivo de sua vida e lança fora o manto, a sua única segurança, a única coisa que ele possuía. Jesus não parte imediatamente para a ação, mas pergunta: “o que quer que faça por você” (v.51)? Certamente Jesus conhece o desejo profundo de Bartimeu, mas quer ouvir, deixar falar, favorecer que ele expresse seus desejos e emoções.

Os discípulos, como tantas pessoas também hoje, reprimem o grito e as emoções de Bartimeu. Como dizia um escritor, mais do que seres “racionais”, somos seres “emocionais”. Jesus abre o caminho para que o cego fale, manifeste seus desejos e emoções. “Mestre, que eu possa ver novamente”(v 51). Outra tradução possível: “Mestre, que eu possa ver de maneira nova”. Bartimeu reconhece que sua visão não é a visão originária do ser humano, da criatura feita à imagem e semelhança divinas. Quer ver novamente, quer ver de “maneira nova”.

Sua cegueira, símbolo dos discípulos até então cegos pela ideologia messiânica triunfalista, agora transformada, o torna seguidor de Jesus. A veste (a ideologia) que antes o revestia e o protegia, ficou lá na beira da estrada, marcando o lugar da mudança. A veste ficou, mas Bartimeu revestiu-se das vestes de seguidor de Jesus que caminha para Jerusalém, cujo horizonte próximo é a morte e morte de cruz. Que possamos ver, de maneira nova, nossa vida de seguimento de Jesus, numa “Igreja Sinodal, de comunhão, participação e missão”. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ