6º Domingo do Tempo Comum

09/02/2023

“Disse Jesus a seus discípulos” – Mt 5,17-37 – Neste 6º domingo do TC continuamos mergulhados no grande discurso do “Sermão da Montanha”, iniciado há dois domingos; um discurso dirigido aos “discípulos”e não às “multidões”. O texto deste domingo é mais longo e nos leva ao corpo do “sermão”. É bom lembrar que o cenário segue sendo o “cimo de um monte” e isto nos faz recordar a montanha do Sinai, onde Deus se revelou e deu a Lei ao seu Povo. Agora é Jesus que, numa outra montanha, oferece ao novo Povo de Deus a Lei perfeita que vai guiar todos os que aceitam a proposta do “Reino”. Neste discurso o evangelista agrupa um conjunto de “ditos” de Jesus e oferece à comunidade cristã um novo código ético, uma nova Lei, um viver sob outra lógica.

 Para entendermos o “contexto” do texto, convém considerar o ambiente das comunidades cristãs primitivas e, de forma especial, o ambiente da comunidade de Mateus. Trata-se de uma comunidade de cristãos, com fortes raízes judaicas, que crêem em Jesus como o Messias enviado. Estamos em torno dos anos 80 d.C. e as comunidades cristãs vivem dúvidas internas e perseguições externas.

A nível externo, temos o Império Romano que persegue e mata os seguidores de Jesus. Além do Império, os judeus não cristãos hostilizam seus irmãos e os entregam nos tribunais.

A nível interno são sérios os questionamentos diante da novidade de Jesus: “continuamos obrigados a cumprir a Lei de Moisés”? -Uns afirmam que sim, outros que não. – “Jesus aboliu a Lei antiga”? – Aboliu muitas coisas, mas levou à perfeição o sentido originário da Lei – “O que é que há de verdadeiramente novo na mensagem de Jesus”? – Havia os que nada viam de novo e outros que percebiam uma ruptura com a antiga Lei. Todas estas dúvidas criavam conflitos e abalavam o fervor dos seguidores de Jesus. Olhemos mais de perto alguns destes “ditos”.

Na primeira parte do Evangelho de hoje (vv. 17-19), Mateus insiste que Jesus não veio “abolir” a Lei dada no Sinai, que conserva todo o seu valor e foi dada por Deus. O problema estava em reduzirem a Lei a um conjunto de prescrições legais e externas, a serem observadas de forma rígida. Os fariseus tinham caído na armadilha de ver a Lei como um conjunto de normas a serem observadas nos mínimos detalhes. O evangelista mostra que a proposta libertadora de Jesus tem outra lógica: trata-se de assumir uma “atitude interior” de compromisso total com Deus e com as suas propostas.

Na segunda parte do texto que nos é proposto (vv. 20-37), temos quatro exemplos concretos desta nova forma de entender e viver a Lei.

 O primeiro (vv. 21-26) refere-se às “relações fraternas”. A Lei de Moisés determina “não matar” (cf. Ex 20,13; Dt 5,17). Para Jesus, o “não matar” implica em evitar causar qualquer tipo de dano ao irmão. Há muitas formas de destruir o irmão, de eliminá-lo, de lhe roubar a vida: as palavras que ofendem, as calúnias que destroem, os gestos de desprezo que excluem, os confrontos que põem fim à relação. A reconciliação com o irmão vale mais do que o culto a Deus.

O segundo (vv. 27-30) refere-se ao “adultério”. A Lei de Moisés exigia não cometer adultério (cf. Ex 20,14; Dt 5,18). Para Jesus, é preciso ir mais além da letra da Lei e mergulhar no próprio coração do homem. As fortes expressões que seguem, de “arrancar o olho”, de “cortar a mão”, mostram que é preciso ir à raiz do problema, na fonte, lá onde nascem as más ações, e eliminar o mal pela raiz.

O terceiro (vv. 31-32) refere-se ao “divórcio”. A Lei de Moisés permite ao homem repudiar a sua mulher (cf. Dt 24,1). O divórcio não estava no plano original de Deus, quando criou o homem e a mulher e os chamou a amarem-se e a partilharem a vida.

O quarto (vv. 33-37) refere-se à questão do “julgamento”. A Lei de Moisés pede a fidelidade aos compromissos selados com um juramento. Para Jesus, ter que jurar significa haver um clima de desconfiança, o que fere as relações dos seguidores de Jesus. Na dinâmica do Reino, isto é inconcebível. A novidade do Reino vem perpassada por uma nova lógica, que supera a lógica da antiga Lei e de suas tradições já cristalizadas. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ