TERCEIRO DOMINGO DE PÁSCOA – 26/04/2020

23/04/2020

Termina o dia, conosco permanece, Senhor Deus, pois já anoitece – Lc 24,13-35 – A liturgia deste 3º domingo da Páscoa convida-nos a reconhecer Jesus vivo, que caminha conosco nas estradas da vida, que anima os nossos corações magoados e desiludidos, que faz aquecer nossos corações com a sua Palavra, que se revela na hospitalidade e na partilha, e anima-nos a sermos testemunhas da ressurreição. A narrativa deste Evangelho é exclusiva de Lucas. Nenhum outro evangelista narra esta pérola literária, humana e teológica. De acordo com o evangelista, dois discípulos dirigiam-se para uma aldeia chamada Emaús, a sessenta estádios de Jerusalém (cerca de 12 km). Até hoje não se sabe bem onde se fica este lugar e Lucas não se detém a dar maiores detalhes. Assim sendo, os estudiosos acentuam a intenção teológica do relato. O que significa isto? Significa que não estamos diante de uma reportagem jornalística de uma viagem geográfica, mas de uma “boa nova” sobre Jesus. A cena coloca-nos, em primeiro lugar, diante de dois discípulos que vão a caminho de Emaús. Um chama-se Cléofas; o outro não é identificado. Poderia ser Maria, a esposa de Cléofas (cf Jo 19,25), ou se trata, para Lucas, de um personagem simbólico, podendo significar “qualquer um” dos seguidores de Jesus. Os dois estão, nitidamente, tristes, decepcionados, desiludidos, pois os seus sonhos de uma vida feliz e vitoriosa, ao lado de Jesus, foram destruídos pela base, terminaram aos pés de uma cruz. Esse Messias “poderoso em palavras e ações”, capaz de derrotar os opressores, de restaurar o reino grandioso de David, revelou-se um grande fracasso. Em lugar de triunfar, deixou-Se matar numa cruz e a sua morte é um fato consumado, pois “é já o terceiro dia depois que isto aconteceu”. Abandonam a comunidade e regressam à sua aldeia, dispostos a esquecer o sonho e suas esperanças. O jeito é, “cair na real”, diríamos, e voltar à vida dura e sem esperança. A discussão entre eles a propósito de “tudo o que tinha acontecido” (v. 14) é a partilha solidária dos sonhos desfeitos. Esta partilha das dores e decepções torna menos doloroso o sofrimento. Hoje, nesta tragédia da pandemia, a humanidade, as comunidades religiosas e eclesiais, mais do que nunca, cada um e uma de nós, precisamos recuperar esta capacidade de “falar e ouvir” os sofrimentos uns dos outros. Não significa transformar a vida em “muro de lamentações”, mas partilhar as dores e sofrimentos, especialmente em situações como esta em que estamos mergulhados: a pandemia do COVID 19.  É a partilha que abre espaço para novas visões, outras descobertas, novas possibilidades. O ficar fechados em nós mesmos mata a vida que só se fecunda na partilha. Isto se faz evidente quando, na sequência do evangelho, a narrativa introduz no cenário um novo personagem: Jesus. Ele se faz companheiro de viagem destes discípulos em caminhada desolada, interroga-os sobre “o que se passou nestes dias” em Jerusalém, escuta as suas preocupações, torna-se o confidente das suas frustrações. Os dois contam a história do “mestre” cuja proposta seduziu-os; mas tudo termina no túmulo. Para responder às inquietações dos dois, Jesus, “começando por Moisés e passando pelos profetas, explicou-lhes em todas as Escrituras o que lhe dizia respeito”. É na escuta e na partilha da Palavra que o plano salvador de Deus ganha sentido. Só através da Palavra de Deus, explicada, meditada e acolhida, se pode perceber que o plano de Deus, o seu amor até às últimas consequências, o dom da vida, são o caminho da vida plena. Isto alcança seu ponto alto na acolhida do ‘’forasteiro em casa”, e na “partilha do pão”. Jesus entrou na vida destes dois discípulos enquanto conversam pelo caminho, enquanto falam de suas dores, enquanto um acolhe a dor do outro. Caminhando e partilhando, surge a vida que aquece o coração e prepara caminho para a experiência de fé na ressurreição.  Um mantra bastante antigo assim cantava: Termina o dia, conosco permanece, Senhor Deus, pois já anoitece. Termina o dia de muitas pessoas nesta pandemia, se faz noite em nossas vidas, conosco permanece Senhor Deus. Ir. Zenilda Luzia Petry – FSJ